domingo, 12 de junho de 2011

Mago e Vidro

Estou relendo a série Torre Negra do Stephen King. Relembrando muitos trechos e navegando nesse mundo que, mesmo sendo uma releitura, não perdeu nem um pouco do brilho.

Não mudei ainda minha opinião sobre eles. Fanstásticos.
Fiquei com vontade de colocar aqui o Posfácio que King escreveu ao final de Mago e Vidro, o 4º livro da série. 


  "A cena em que Roland supera seu velho professor, Cort, e sai para fazer uma farra na área menos ecológica de Gilead foi escrita na primavera de 1970. Aquela em que o pai de Roland aparece na manhã seguinte foi escrita no verão de 1996. Embora se passem de 16 horas entre as duas occorências no mundo da história, 26 anos se passaram na vida do contador da história. Contudo, a hora finalmente chegou e acabei me confrontando comigo mesmo por meio da cama de uma prostituta - o estudante desempregado de cabelo preto comprido e barba de um lado, o bem-sucedido e popular escritor ("o mestre do pior da América", como sou afetuosamente conhecido por minhas legiões de críticos admiradores) de outro.
  Só faço menção a isto porque resume a estranheza essencial da experiência da Torre Negra para mim. Escrevi uma quantidade de romances e contos suficiente para preencher um sistema solar da imaginação, mas a história de Roland é meu Júpíter - um planeta que transforma todos os outros em anões (pelo menos de minha própria perspectiva), um lugar de atmosfera estranha, paisagem louca e selvagem força gravitacional. Transforma os outros em anões, foi o que eu disse? Na realidade, acho que é mais que isso. Estou começando a entender que o mundo (ou mundos) de Roland na realidade contém todos os outros que imaginei; há um lugar no Mundo Médio para Randall Flagg, Ralph Roberts, os garotos errantes de Os Olhos do Dragão e até para o Padre Callahan, o padre amaldiçoado de A Hora do Vampiro, que saiu da Nova Inglaterra num ônibus da Greyhound e acabou se fixando na fronteira de uma terra terrível do Mundo Médio chamada Trovão. Parece ser aí que todos eles terminam, e por que não? O Mundo Médio estava aqui primeiro, antes de todos, dormindo sob o foco azul dos olhos de artilheiro de Roland.
  Este livro demorou muito a sair - muitos leitores que gostaram das aventuras de Roland quase gemeram de frustração - e me desculpo por isso. A razão é mais bem resumida pelo pensamento de Susannah quando ela se prepara para lançar contra Blaine a primeira adivinhação de sua disputa: É difícil começar. Não há nada nestas páginas com que eu esteja mais de acordo.
  Eu sabia que Mago e Vidro significava voltar aos dias de juventude de Roland e a seu primeiro amor, e eu estava com um medo mortal dessa história. Fazer suspense é relativamente fácil, ao menos para mim; falar de amor é difícil. Consequentemente, eu fazia corpo mole, arranjava justificativas, adiava e continuava sem escrever o livro.
  Por fim comecei, trabalhando em quartos de motel no meu Macintosh PowerBook, enquanto cruzava o país dirigindo do Colorado ao Maine após concluir meu trabalho na versão de O Iluminado para uma minissérie. Ocorreu-me, enquanto eu dirigia para o norte atravaessando os quilômetros desertos do oeste de Nebraska (onde por acaso eu também passara, voltando do Colorado, quando tive a idéia de escrever uma história chamada Colheita Maldita), que se eu não começasse logo, acabaria jamais escrevendo o livro.
  Só que eu não sei mais nada sobre a força do amor romântico, disse a mim mesmo. Sei alguma coisa sobre casamento e amor maduro, mas aos 48 anos a pessoa esquece o ardor e a paixão dos 17.
  Vou ajudá-lo nessa parte, veio a resposta. Eu não sabia a quem aquela voz pertencia naquele dia nos arredores de Thetford, Nebraska, mas sei agora, porque tenho olhado dentro de deus olhos, através da cama de uma prostituta, numa terra que existe com muita nititdez em minha imaginação. O amor de Roland por Susan Delgado (e dela por ele) me foi contado pelo rapaz que começou a escrever esta história. se foi contado corretamente, agradeço a ele. Se não, jogo a culpa no que possa ter se perdido na passagem dele para mim.
  ....
  Um dia, numa época difícil, ela me deu uma engraçada figurinha de borracha que me fazia sorrir. Era Rocket J. Squirrel, usando seu chapéu azul de aviador e com os braços bravamente estendidos. Pus essa figura no manuscrito que começava a aumentar (e aumentar...e aumentar), epserando que o amor que cinha com ela conseguisse fertilizar a obra. Certamente a coisa funcionou, pelo menos até certo certo ponto; afinal, o livro está aqui. Não sei se é bom ou ruim - perdi todo o senso de perspectiva por volta da página 600 -, mas está aqui. Só isso já parece um milagre. E comecei a acreditar que talvez vivesse o bastante para completar este ciclo de histórias (batida na madeira).
  Há pelo menos mais três a serem contadas, eu acho, duas ambientadas principalmente no Mundo Médio e uma quase de todo em nosso mundo - a que trata do terreno baldio da esquina da segunda Avenida com a rua 46 e da rosa que floresce ali. Essa rosa, tenho de dizer a vocês, está em terrível perigo. 
  No final, o ka-tet de Roland chegará à paisagem noturna do Trovão... e ao jaz além dela. Talvez nem todos vivam o suficiente para alcançar a Torre, mas creio que aqueles que conseguirem vão resistir e se conservarão fiéis à prova."

                                                                        STEPHEN KING
                                                                        Lovell, Maine
                                                                        27 de outubro de 1996.